Resumo:"Existem emendas constitucionais que são ostensivamente incompatíveis com o texto promulgado pelo Poder Constituinte Originário, e o STF, tribunal político, faz vistas grossas a isso. E se assim ocorre com as emendas constitucionais, com mais frequência ocorre com a legislação infraconstitucional. É emblemática nesse sentido a Lei Complementar nº 114/2002, que, ao alterar a Lei Complementar nº 87/1996, que cuida do ICMS, ampliou o campo de incidência do tributo, mediante deturpação dos conceitos de 'operações' e de 'mercadorias'. As alterações perpetradas pela LC 114/2002 foram aprovadas por força da pressão da máquina dos Estados sobre o Congresso, conseguindo, desse modo, calar a doutrina e dobrar a jurisprudência então dominantes, ampliando o raio de alcance do ICMS, fazendo surgir um imposto novo, passando a autorizar a cobrança do tributo de pessoas antes não consideradas contribuintes e alargando o conceito de 'mercadoria' para alcançar outros bens. O novo imposto, resultante dessas inovações, deveria ter outro nome, cuja sigla poderia ser 'ICMBS' - acrescentando-se o B de 'bens', pois é impróprio continuar rotulado de ICMS, uma vez que não incide mais apenas sobre operações com mercadorias. Além de deturpar, inconstitucionalmente, o conceito de 'mercadoria', a LC 114/2002 deturpou também o conceito de 'operações', que, na concepção do Legislador Constituinte Originário, compreendia apenas as operações mercantis. Em virtude das alterações inconstitucionais introduzidas na LC 87/1996 pela LC 114/2002, o cidadão que arremata bens para uso próprio em leilão público, mesmo sem caráter de habitualidade e sem ser comerciante, deve pagar o ICMS, sendo inquestionável que, em tal situação, não há uma 'operação mercantil'."