Localidade
Brasil
Autoridade
Superior Tribunal de Justiça. 6ª Turma
Título
HC 660930 / SP
Data
14/09/2021
Ementa
HABEAS CORPUS. TRÁFICO. 1,53 GRAMAS DE COCAÍNA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DOSIMETRIA. DESPROPORCIONALIDADE. VALORAÇÃO NEGATIVA DA PERSONALIDADE COM FUNDAMENTO EM ANTECEDENTES CRIMINAIS. IMPOSSIBILIDADE. FLAGRANTE ILEGALIDADE. QUANTIDADE DE DROGA QUE NÃO JUSTIFICA AFASTAR A CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. ÍNFIMA QUANTIDADE QUE DEVE PREVALECER SOBRE A REINCIDÊNCIA, PERMITINDO FIXAR REGIME MAIS BRANDO E SUBSTITUIR A REPRIMENDA. FLAGRANTE ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA À UNANIMIDADE. AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE EIVADO DE NULIDADE. BUSCA PESSOAL. FUNDADA SUSPEITA ORIGINADA EM ELEMENTO INIDÔNEO. COR DA PELE NÃO PODE CONFIGURAR ELEMENTO CONCRETO INDICIÁRIO DE DESCONFIANÇA DO AGENTE DE SEGURANÇA PÚBLICA. ILICITUDE DOS ELEMENTOS DE PROVA QUE EMBASARAM A CONDENAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. CONVICÇÃO DO RELATOR NÃO ACOMPANHADA NA SEXTA TURMA. 1. A valoração negativa da personalidade com fundamento nas condenações transitadas em julgado não encontra respaldo na atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada no sentido de que eventuais condenações criminais do réu transitadas em julgado e não utilizadas para caracterizar a reincidência somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente. Precedentes da Quinta e da Sexta Turmas desta Corte (EAREsp n. 1.311.636/MS, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 26/4/2019 - grifo nosso). 2. A ínfima quantidade da droga apreendida não justifica o afastamento da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, sendo perfeitamente cabível a sua aplicação em patamar intermediário (1/2), diante da reincidência. 3. Ordem concedida para redimensionar a pena, com modificação do regime e reconhecida a possibilidade de substituição da pena por duas restritivas de direito a serem fixadas pelo Juízo das Execuções Criminais. 4. Busca pessoal do paciente feita em razão de o mesmo ser negro conforme depoimento dos responsáveis pelo flagrante: "QUE AO PASSAR PELA RUA SANTA TERESA, QUADRA 4, AVISTOU AO LONGE UM INDIVÍDUO DE COR NEGRA QUE ESTAVA EM CENA TÍPICA DE TRÁFICO DE DROGAS, UMA VEZ QUE ELE ESTAVA EM PÉ JUNTO O MEIO FIO DA VIA PÚBLICA E UM VEÍCULO ESTAVA PARADO JUNTO A ELE COMO SE ESTIVESSE VENDENDO/COMPRANDO ALGO" e "QUE AO SE APROXIMAREM DA RUA SANTA TERESA VIRAM UM INDIVÍDUO NEGRO QUE "SERVIA" ALGUM USUÁRIO DE DROGA EM UM CARRO DE COR CLARA". 5. A cor da pele do paciente foi o que, considerando o depoimento dos policiais responsáveis pelo flagrante, despertou a suspeita que justificou a busca pessoal no paciente. Ainda que não tenha sido somente a cor da pele, mas, sim, todo o contexto, como estar o indivíduo ao lado de veículo, em atitude de mercancia, em área de tráfico, pela experiência dos policiais, a meu ver, a cor da pele foi o fator que primeiramente despertou a atenção do agente de segurança pública, o que não pode ser admitido. 6. Este Superior Tribunal de Justiça por diversas vezes constatou abusos praticados pelas forças policiais na execução das buscas pessoal e domiciliar, concedendo a ordem para reconhecer a nulidade das provas obtidas nessas buscas irregulares, com a consequente absolvição dos acusados. 7. Não se pode ter como elemento ensejador da fundada suspeita a convicção do agente policial despertada a partir da cor da pele, como descrito no Auto de Prisão em Flagrante constante dos autos, sob o risco de ratificação de condutas tirânicas violadoras de direitos e garantias individuais, a configurar tanto o abuso de poder, quanto o racismo. 8. Nula a abordagem realizada pelos policiais militares, diante da manifesta ausência de fundada suspeita de o paciente estar portando drogas no momento da abordagem, acarretando a ilicitude das provas obtidas por meio da busca pessoal. 9. Ausentes os elementos probatórios que ensejaram a condenação, a sentença deverá ser anulada, absolvendo-se o paciente por ausência de provas da materialidade do delito. 10. Na sessão de julgamento de 14/9/2021, a Sexta Turma não acompanhou o Relator na concessão da ordem de ofício, quanto à ilegalidade da busca pessoal, à mingua de fundada suspeita. 9. Ordem concedida, à unanimidade, nos termos da impetração, a fim de redimensionar a pena para 2 anos e 11 meses de reclusão, além de 250 dias-multa, no valor mínimo legal, e, de ofício, para estabelecer o regime aberto e determinar a substituição da pena privativa de liberdade por duas medidas restritivas de direitos a serem fixadas pelo Juízo das Execuções Criminais.

Decis?o

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder o habeas corpus, inclusive de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencido, em parte, o Sr. Ministro Relator quanto à concessão da ordem de ofício, para reconhecer a nulidade das provas e absolver o paciente. Os Srs. Ministros Rogerio Schietti Cruz, Antonio Saldanha Palheiro, Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região) e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator quanto à concessão da ordem para redimensionar a pena e, de ofício, fixar o regime aberto e substituir a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito.
Nome Uniforme
urn:lex:br:superior.tribunal.justica;turma.6:acordao;hc:2021-09-14;660930-2092462

Publicação Oficial

Publicação Original
2021-09-21
Diário da Justiça Eletrônico. 21/09/2021. p.

Outras Publicações

Publicação Original
2021-09-14
Superior Tribunal de Justiça (text/html) Superior Tribunal de Justiça
[ http://www.stj.jus.br/SCON/servlet/BuscaAcordaos?action=mostrar&num_registro=202101169756&dt_publicacao=21/09/2021 ]

Do mesmo processo

2021-09-14
HC 660930 / SPurn:lex:br:superior.tribunal.justica;turma.6:acordao;hc:2021-09-14;660930-2092462

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